A Globo decidiu colocar a final da Copa do Mundo de 2002 no seu horário do futebol no domingo à tarde. Afinal, se não há futebol rolando, vamos lembrar dos bons momentos, não é mesmo? Eu particularmente já tinha visto o jogo antes, mas é sempre divertido voltar no tempo, sentar com calma e ver uma partida antiga, sem o nervosismo com o resultado e, para quem era novo à época, mais conhecimento e experiência com o jogo.
Vamos então à lista de sete coisas que aprendemos com a reprise da final da Copa de 2002.
Os melhores foram os coadjuvantes
Quando você faz dois gols na final da Copa do Mundo, é óbvio que o mundo ficará a seus pés. Mas não foi o melhor jogo de Ronaldo e nem de Rivaldo na Copa, mas eles apareceram quando deveriam. Ronaldinho Gaúcho foi completamente apagado.
Quem realmente jogou muito foi Kleberson, o que só deixa sua sequência na carreira ainda mais confusa. Suas duas chances no primeiro tempo foram criações de seu estilo de jogo, com uma arrancada como elemento surpresa e um belo chute que explodiu no travessão. Onde foi parar esse jogador? Roque Junior também foi fundamental, mas com um porém que trataremos mais tarde.
Marcos fez uma grande partida, com a defesa no chute de Neuville sendo o lance mais lembrado, mas particularmente acho o chute de Bierhoff no final da partida, quase na pequena área, mais impressionante.
Era outro futebol
O futebol dos anos 80 e 90 era mais aberto e com espaços e em 2002 já começávamos a ver as sementes do futebol mais físico e intenso que existe hoje. Mas ainda assim o ritmo era completamente diferente. Só notar que o espaçamento entre a linha de ataque e de defesa era enorme e é natural ver lances com 4 pessoas atacando ou só 4 ou 5 defendendo. Não à toa ter dois laterais de categoria e que “espetavam” fazia tanta diferença e até o Lúcio arrancando gerava algo: você podia ter superioridade numérica até no ataque de forma muito mais fácil.
Um dos lances mais 2020 nesse jogo de 2002 foi justamente o do primeiro gol: Ronaldo perdeu a bola e imediatamente foi atrás dela. A regra dos cinco segundos de Guardiola de marcação-pressão depois de perder a bola no ataque teve um precursor: Ronaldo roubou, passou para Rivaldo, este chutou, Kahn ajudou e o camisa 9 abriu o placar.
Ronaldo estava em outra fase
A explosão ainda existia, mas Ronaldo já não era o mesmo touro que foi nos anos 90, na sua passagem pelo Barcelona e Inter de Milão. E ele foi substituindo isso pelo posicionamento exemplar e sua inteligência muito acima da média. Romário conseguiu o mesmo.
O Ronaldo da Copa de 1998 e a de 2002 são dois exemplos do monstruoso jogador de futebol que foi o Fenômeno, conseguindo ser o melhor com estilos completamente diferentes e uma explosão de joelho ao vivo para o mundo inteiro ver no meio desses anos.
Zagueiros e goleiros mudaram completamente
Todos os jogadores tiveram que se adaptar aos novos tempos do futebol, mas zagueiros e goleiros foram os principais. Se o Marcos recebesse uma bola para trabalhar com o pé seria uma tragédia. Por isso é até curioso pensar que Rogerio Ceni, terceiro goleiro na Copa, fosse talvez o que melhor se adaptaria a 2020.
Os zagueiros brasileiros nem eram dos mais atrasados, os famosos becão de fazenda. Edmilson era técnico e Lucio sabia jogar com a bola nos pés. Mas ambos estão longe de completar as exigências que um zagueiro hoje tem que completar com a bola no pé e ainda ser rápido. Isso não quer dizer que eles sejam melhores ou piores, apenas diferentes. A diferença entre os zagueiros e goleiros atuais com os de 2002 é maior que a de atacantes e meias.
Não foi a melhor Copa
O Brasil tinha uma seleção muito talentosa. Mais talentosa que em 94, por exemplo. Mas em 1998 a diferença com a bola no pé dos brasileiros para o resto do mundo foi mais vista. O resultado final diferente e feliz tem a ver com algumas coisas. A primeira é que a seleção era mais equilibrada e também experiente.
Mas a Copa de 2002 também foi pior que a de 1998. Encarar uma temporada europeia, terminar os jogos, viajar até a Coreia do Sul e do Japão, treinar por três semanas e jogar em um fuso horário completamente diferente é quase uma crueldade com os atletas. E seleções que eram para ter chegado longe ficaram pelo caminho de forma vergonhosa: França e Argentina são os exemplos óbvios.
Ainda teve a Coreia do Sul em uma campanha criminosa futebolisticamente, já que foi beneficiada de forma absurda contra Itália e Espanha. E a Alemanha, que não tinha uma grande seleção, muito longe disso, chegou na final. Ballack, o melhor jogador de linha, estava suspenso na decisão.
Claro que não é legal vir aqui cagar sobre um título, ainda mais quando estamos em uma seca que chegará a duas décadas. Mas também temos que ser honestos.
Cafu e Roberto Carlos
Não é só o futebol brasileiro (o jogado aqui) que vive uma seca de laterais. O mundo inteiro sofre com isso. O Brasil ainda teve uma boa renovação com Marcelo e Daniel Alves e por mais que dê para discutir e comparar a nova geração com a antiga, Cafu e Roberto Carlos para mim ainda são soberanos.
Quando eles se apresentam para o ataque não existia um contraponto e a defesa dos alemães precisava esticar, sobrando feudos para Ronaldo e Rivaldo povoarem. A qualidade no passe, inteligência no posicionamento, sempre a escolha da melhor jogada e ainda ameaça de chute, cruzamento ou passe fazia a seleção brasileira ter quatro armadores basicamente (os dois mais Rivaldo e Ronaldinho).
Marcelo é ótimo. Eu não sou o maior fã de Daniel Alves, mas sua carreira e resultados são inegáveis. Mas Cafu e Roberto Carlos são outro nível e é capaz de nunca mais termos algo assim.
Também não teremos outro Galvão
Galvão Bueno gera reações exageradas das pessoas. Só que ele é a voz para o Brasil nesses momentos. Sem ele narrando a seleção, a vinheta Brasil il il e a Globo, parece que o jogo perde 10% da emoção logo de cara. Hoje em dia nós temos mais N opções de narradores, comentaristas e canais, ou seja, as coisas são mais diluídas que em 2002, quando todo mundo ligava na Globo para ver a seleção. Por isso a ideia de ter um cara que contaria aquela história para 180 milhões de pessoas não existe mais. Isso não é uma coisa ruim necessariamente, mas Galvão Bueno no auge não tem paralelo.