Arsenal: o buraco sem fundo no qual o time se meteu

Enquanto torcedor de um clube considerado grande, é sempre difícil observar momentos de decadência e crise, principalmente quando eles parecem durar mais do que seria “normal”. É exatamente o meu caso enquanto torcedor do Arsenal, que está, ao que parece, no buraco mais fundo que já se meteu em muitas décadas.

O que pode explicar o momento tão ruim do time? Será que é possível sair dele? É isso que vamos tentar analisar nesse post, que promete ser amargo, mas sóbrio.

Uma nova era que não chegou

É impossível começar a falar sobre o Arsenal de hoje sem citar o homem que, durante longos 22 anos, foi o cabeça por trás de virtualmente tudo que acontecia no clube, dentro e fora de campo: Arsène Wenger, lendário técnico francês que deixou o comando do time em 2018.

É verdade que, desses 22 anos, os últimos 10 ou 12 foram bem complicados. Começando pela construção faraônica do Emirates Stadium, que endividou o clube por muitos anos, o Arsenal passou de gigante competir de títulos europeus para, no máximo, candidato a Top 4 da Premier League.

Há que se creditar, porém, os diversos milagres que Wenger fez com o time ao longo dos anos. Sem fôlego financeiro para contratar ninguém de peso por muitas temporadas, o técnico francês ainda assim garantiu seu time em todas as Champions League de 1998 a 2017 – um recorde inglês e atrás apenas do Real Madrid em termos de Europa.

A questão é que, mesmo tirando leite de pedra e conquistando troféus importantes já em tempos difíceis, como as FA Cup de 2014, 2015 e 2017, os torcedores e o clube em si estavam cansados da crescente irrelevância do Arsenal na disputa da Premier League e também da Champions. O técnico resistiu inicialmente, mas pediu as contas ao final da temporada 2017-18.

Quem achou que ali começaria uma nova era, porém, se decepcionou. Aliás, a nova era até chegou, mas não trouxe quase nenhuma das alegrias que eram esperadas.

A liderança que não convence

Depois de um começo empolgante, Arteta está se mostrando uma gigantesca decepção para o torcedor do Arsenal, cuja paciência está chegando ao fim

O “eleito” para substituir Wenger foi o espanhol Unai Emery, que vinha com experiência do Sevilla e do PSG para tentar recolocar os Gunners no patamar mais alto do futebol europeu. O máximo que o treinador conseguiu, porém, foi chegar a uma final de Europa League em 2018-19 – na qual foi surrado pelo rival londrino Chelsea.

Esse é o lado positivo, por incrível que pareça. Sem conseguir levar os Gunners à Champions e amargando uma 8ª posição na tabela, Emery caiu e foi substituído por Mikel Arteta, ex-capitão do Arsenal até 2016. O também espanhol, aliás, já era favorito ao cargo antes mesmo de Emery fechar com o time, já que o cargo de luxo de assistente técnico de Guardiola no Manchester City fizeram crescer os olhos da diretoria.

Mais uma vez, é preciso dar créditos ao novo treinador antes de começar a criticar; Arteta arrumou boa parte da bagunça deixada para trás por Emery, demitido no meio da temporada e, embora o Arsenal só tenha acabado em 8º na Premier League, conseguiu vencer a FA Cup em cima do Chelsea, uma vingança saborosa da Europa League anterior.

Falando em Europa League, porém, foi ali que as coisas começaram a parecer querer a ruir, ainda bem cedo; o Arsenal acabou eliminado pelo fraquíssimo Olympiacos, dentro de casa, ainda na fase 16 avos de final.

Nada disso se compara, porém, ao verdadeiro caos que está se mostrando a temporada 2020-21 até agora. Arteta completou 1 ano no comando no dia 20 de dezembro, mas foi um aniversário sem festa nem presente; o Arsenal está em 15º na Premier League, não vence há sete partidas e está a só 4 pontos da zona de rebaixamento.

Tudo isso já seria ruim o suficiente sem contar a eliminação vexatória da Copa da Liga Inglesa diante do Manchester City, que venceu por 4×1, e o problema mais preocupante de todos: a crise no vestiário.

Finanças mal-usadas

Se a crise no Arsenal fosse financeira, como aconteceu com o Cruzeiro, daria para justificar uma série de problemas com uma simples falta de investimento. O que acontece com o time de Londres, porém, é diferente.

Nada ilustra melhor do que isso do que comparar os gastos dos Gunners com os de outros times da Premier League. Os dados mais recentes são da temporada 2018-19, mas são chocantes: o Arsenal gastou 329 milhões de libras esterlinas em contratação, aproximadamente o mesmo que o Liverpool (337 milhões de libras), sendo que os Reds acabaram campeões da UEFA Champions League naquela temporada e da Premier League no ano seguinte

O que se vê, na verdade, é um retorno muito aquém do esperado dos investimentos caríssimos feitos nos últimos anos. Entre os grandes nomes vale citar acima de todos o de Nicolas Pépé, comprado a peso de ouro na contratação mais cara da história do clube – 80 milhões de libras – e que sequer é titular no time de Arteta.

Show de horrores em campo

Contratação mais cara da história do Arsenal, o marfinense Pepé não é nem sombra do que se esperava dele quando foi comprado junto ao Lille

A melhor maneira de analisar o momento de um time, é óbvio, é olhando para os resultados recentes e tentando entendê-los. No caso do Arsenal, significa olhar para uma sequência de jogos horríveis, nos quais o time passou vergonha inclusive diante dos piores adversários do Campeonato Inglês.

Depois de, ironicamente, vencer o rival Manchester United no Old Trafford pela primeira vez desde 2007, enchendo o torcedor de ilusões, o Arsenal caiu num buraco negro de resultados ruins em sequência: 0x3 para o Aston Villa, 0x0 com o Leeds, 1×2 para o Wolverhampton, 2×0 para o arquirrival Tottenham, 0x1 para o horroroso Burnley (briga contra o rebaixamento), 1×1 com o Southampton e 1×2 para o Everton.

Todos esses jogos serviram para expor as rachaduras cada vez mais nítidas na espinha do time; a coisa está tão feia que é mais fácil falar com quem a torcida não está irritada, ao invés de o contrário: o goleiro Leno, o lateral Tierney, o zagueiro Gabriel Magalhães e os atacantes Sakah e Gabriel Martinelli. E só.

Aubameyang vive uma das maiores secas da carreira e a paciência dos torcedores com gente como Xhaka, Mustafi, David Luiz, Maitland-Niles, Elneny, Ceballos, Lacazette e Willian, para citar os alvos mais frequentes das críticas. A coisa não poderia estar mais feia.

Crise no elenco

O goleiro Leno é um dos pouquíssimo admirados e louvados pela torcida em momentos difíceis, mas sozinho não é capaz de fazer o time jogar bem

Coisas estranhas começaram a rolar no vestiário do Emirates desde que não só Arteta, mas Kia Joorabchian e Edu Gaspar – sim, os velhos conhecidos dos torcedores do Corinthians – chegaram às posições de poder no clube. Com o polêmico, em geral detestado e, principalmente, ausente Stan Kronke na presidência, então, o poder de decisão do trio se potencializou.

Muitas das contratações creditadas ao trio foram vistas com suspeita, como Cedric Soares, Rúnarsson e, principalmente, o também brasileiro Willian, mas o buraco é mais embaixo, e diz respeito também a quem foi embora, como Guendouzi e Torreira.

O mais problemático também, é que Arteta e os diretores de futebol deram início a uma espécie de caças às bruxas que desmantelou a confiança dos jogadores. O maior representante das “vítimas” disso é Mesut Özil, que não foi inscrito em nenhuma competição e não está muito longe da categoria “persona non grata” no Emirates. O zagueiro Sokratis Papastathopoulos segue na mesma toada.

Somado isso com o fato de haver jogadores que estão insatisfeitos e, segundo rumores internos, insubordinados perante o técnico Arteta, caso de David Luiz, Pepé e Lacazette, entre outros, a panela de pressão parece pronta para explodir.

Gostaria de poder encerrar com a frase “o que segura o técnico no cargo é X” ou então “para a situação melhorar é preciso que Y aconteça”, mas eu não sei o que são essas variáveis. Ninguém sabe.

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